quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Chaminé alentejana - Filhoses de Natal




As casas típicas alentejanas caracterizam-se pelas suas chaminés. Supostamente de origem árabe, elas podem ser cilíndricas, quadradas ou rectangulares.
No alto das chaminés, costumam estar cata-ventos, representando figuras variadas em função das localidades como galos, peixes, cães ou D. Afonso Henriques montado no seu cavalo. Algumas estão datadas.  Todas são verdadeiras obras de arte.


As suas dimensões variam e podem chegar até aos três metros de altura, com um metro de diâmetro. Diz-se que o seu tamanho representava o estatuto social de quem as mandava construir, podendo até existir várias chaminés num mesmo telhado.


A chaminé era um local chave na casa, pois era por baixo da sua abóbada que a família se costumava reunir. Ali se cozinhava, se contavam histórias aos serões, se recebiam os convidados à volta da fogueira e até se penduravam os enchidos para secarem. Mas as chaminés e principalmente as de “escuta” tinham essa coisa maravilhosa que lhes permitia devido ao seu tamanho, ouvir tudo o que se passava na rua. O que se revestiu de grande importância, pois parece que durante a Inquisição, os cristãos novos dando-se conta do que se passava lá fora, tinham tempo de fugir ou de esconder qualquer objecto religioso capaz de os comprometer perante os inquisidores.
Hoje em dia e agora que o frio já se faz sentir, as chaminés voltam a acender-se, e no ar paira um leve e delicioso odor a lenha queimada. Respira-se um ambiente como não há outro igual.
 E agora, imagine-se depois de um longo dia de trabalho, sentado confortavelmente debaixo de uma destas grandes chaminés. Lá fora está frio e chove. A trovoada aproxima-se e a chuva cai cada vez com mais força. O seu olhar fixa-se no lume e ouve o som suave e langoroso de um cante alentejano misturado com o crepitar da lenha a arder e o barulho da chuva a bater nas janelas. As chamas dançam para si, e projectam a sua sombra nas paredes da chaminé. A temperatura está agradável, e sente-se invadido por uma doce e agradável sensação de paz e tranquilidade.



Aproveite este momento, pois nesta altura de grandes conflitos, só conseguiremos afastar-nos das nossas preocupações e vencer todos os obstáculos se nos mantivermos em harmonia e em equilibro connosco. Por isso, nada melhor do que dar mais importância a estes pequenos momentos de prazer. Estes ninguém nos tira.
Como vê para ser feliz, não é preciso grande coisa. Uma simples lareira e um bom lume. Claro se juntar a isto os seus amigos e familiares, um bom livro para ler, a sua malha ou croché, com um copinho de vinho, chá ou café e uns bolinhos, a felicidade estará mais completa. 
Assim, para que não lhe falte nada, e como estamos perto do Natal, chegou a hora de começarmos a pensar nos doces de Natal. Hoje, vamos às filhoses com aguardente. Fininhas e saborosas tal e qual a minha mãe fazia. 

FILHOSES DE NATAL
Ingredientes
1 kg farinha de trigo sem fermento
3 laranjas cortadas ao meio
3 ovos
1 copo de aguardente
100 g banha derretida
3 a 4 colheres de sopa de azeite previamente aquecido com uma côdea de pão (para lhe retirar a acidez)
Óleo para fritar q.b
sal q.b

Pôr a farinha num alguidar, fazer uma cova e espremer o sumo das laranjas dentro da cova. Deitar os ovos, o sal e a aguardente.
Entretanto aquecer o azeite. Quando estiver quente, fritar uma côdea de pão para lhe retirar a acidez.
Depois retirar a côdea e deitar o azeite na farinha juntamente com a banha derretida. Amassar muito bem.
Pôr um pouco de água a ferver com as cascas das laranjas, mas só durante 2 a 3 minutos para não amargar.
Regar pouco a pouco a massa com a água quente das cascas, à medida que vai secando. Continuar a amassar até que a massa não pegue nas mãos. A massa tem de ficar quente para se poder esticar bem. Pode cortar a massa em dois pedaços e amassar uma metade de cada vez.
Polvilhar a mesa com um pouco de azeite e experimentar esticar um pouco de massa. Se ela se partir ainda não está boa. Continuar a amassar até que fique mais elástica e se consiga esticar bem. Depois com o rolo (ou se não tiver uma garrafa de vidro) untado um pouco de azeite estender devagarinho a massa o mais finamente possível. Cortar a massa com uma recortilha em forma de rectângulos ou quadrados e fazer três riscos ao meio. Pegar delicadamente e colocar numa toalha para ir secando.
Depois de estendidas todas as filhoses, fritá-las em óleo quente, onde também previamente se fritou uma côdea de pão. Virar as filhoses no óleo e retirar logo a seguir para não ficarem queimadas.
Colocar numa travessa. Na altura de servir polvilhar com açúcar.


O meu pai costumava, e já era quase uma tradição para ele, na manhã do dia de Natal, ao pequeno-almoço, comer uma filhós com um copinho de aguardente. Uma delícia, dizia ele!

sábado, 19 de novembro de 2011

Vencer a crise-Sopas de toucinho com poejo

Tinha prometido que neste blogue só abordaria temas que falassem do nosso Alentejo naquilo que ele tem de melhor. Mas quando todos os dias abrimos os jornais ou ligamos a televisão e que só ouvimos falar em crise, como fingir que nada se está a passar e assobiar para o lado? Estamos em crise. Pois estamos, mas em crise já estamos há muito tempo, principalmente no Alentejo que sempre foi uma região sacrificada. Mas agora, como antigamente, acredito, que uma vez mais os Alentejanos vão saber mostrar o seu carácter, determinação e força para enfrentar esta terrível situação. Vamos ter de voltar às nossas sopas? Não se apoquentem, pois adaptando a frase de Fernando Pessoa, atrevo-me a dizer: “Tudo é saboroso quando a arte não é pequena”.


Lembram-se quando nos campos não havia trabalho, e que tudo servia para sustentar uma família? As pessoas eram obrigadas a comer as ervas que encontravam nas margens das ribeiras ou das terras baixas. Um pouco de água, pão duro, uns coentros ou poejos, azeite e um alho e lá se fazia uma bela açorda.

E foi assim, que não havendo mais nada, os comeres pobres alimentavam famílias inteiras. Beldroegas, cardos, acelgas, poejo, coentro, óregãos, sarramago, espargos, alabaça, hortelã da ribeira eram ervas espontâneas e sazonais que cresciam cada uma em sua época do ano. Era só apanhá-las e saber cozinhá-las. Assim, nasceram as açordas, as migas, os calduchos, ou seja, a base da gastronomia alentejana que hoje é tão apreciada. Com pouco souberam criar verdadeiros pitéus, que hoje fazem parte do património gastronómico deste povo. Nas famílias mais abastadas, também rurais, estes manjares eram enriquecidos com peixe assado na brasa, carne frita ou linguiça e queijo.

Em todas as estações do ano encontram-se estas ervas aromáticas, assim e só para citar algumas, e sem ser demasiado rigoroso, pode-se dizer que crescem:
Entre Janeiro e Março: poejos, alabaças, arrabaças e espargos
De Abril a Junho: correóis, cardinho
Maio e Julho: beldroegas
Setembro até Outubro: silarcas,
Novembro e Dezembro: pampilhos, sarramagos
Em Agosto é mais difícil encontrar qualquer destas ervas pois o calor intenso não é propício ao seu crescimento. No entanto, algumas podem ser cultivadas. Eu por exemplo tenho coentros, poejos e também hortelã na minha hortinha caseira.

E porque com o frio que ai vem é tempo de se aquecer o corpo, assim, hoje proponho uma sopa de tomate com toucinho e poejo, erva que com sorte se pode encontrar ao longo do ano junto às ribeiras e barragens, e que é excelente para ajudar a curar as constipações e a tosse.


Sabia que os poejos pertencem à família das mentas (hortelã e hortelã da ribeira) são conhecidos há séculos em todo o Mediterrâneo e Ásia ocidental pelas suas propriedades relaxantes quando tomados em infusão. O poejo também é recomendado como expectorante, contra a gripe, tosse crónica, calmante para o sistema nervoso, constipações, insónias, dores reumáticas, acidez do estômago, fermentação, enjoo, bronquite e asma. Em Portugal é usada para culinária, infusões e também para o fabrico de licor, principalmente no sul do país. Por extracção de um óleo essencial, também pode ser usada em aromaterapia. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Poejo).

Ora vamos lá.

SOPAS DE TOUCINHO COM POEJOS E TOMATE

Ingredientes:
Pão duro
Água
2 ou 3 colheres de azeite
200 gr de tomates maduros sem pele (ou uma lata pequena de tomates)
1 cebola
3 dentes de alho
1 folha de louro
Poejo q.b
Pimento vermelho q.b
1 ovo por pessoa

Fritar o toucinho com um pouco de azeite (facultativo), uma folha de louro e um dente de alho. Quando frito reservar para um prato. Colocar a gordura do toucinho num tacho juntamente com o tomate, a cebola picada e o resto do alho picado. Deixar amolecer. Quando começar a levantar fervura, acrescentar um prato fundo de água por pessoa. Deixar ferver um pouco.

Escalfar os ovos e colocar o pimento e 2 pernadinhas de poejo +/- 1,5 minutos, para não ficar com muito sabor a poejo e o pimento não ficar muito cozido. Retirar o poejo, assim não fica muito amargo e o pimento digere-se melhor.







Deitar o caldo numa tigela sobre o pão cortado.







Acompanhar com o toucinho.




As sopas de toucinho podem ser feitas também sem tomate.

Que me dizem a isto? Fácil, barato e simplesmente delicioso. Bom proveito.



E para terminar em beleza, vamos ouvir "Açorda de Coentros e Alhos" do grupo de música popular Alencanto.


(vídeo saboresdoAlentejo)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Lume, castanhas e vinho e viva o S.Martinho

No Alentejo todas as ocasiões são boas para festejar com amigos e familiares. Com o S. Martinho à porta, é a ocasião ideal para que todos se juntem à volta de uma fogueira onde se assam castanhas e partilham alguns petiscos.

Abrem-se as talhas das adegas e prova-se  o vinho novo, a jeropiga ou a água-pé. Neste dia de Magusto “lume, castanhas e vinho” não podem faltar, como também não faltam a música e a boa disposição. Um pouco por todo o lado canta-se, bebe-se, dança-se e festeja-se o dia 11 de Novembro, data em que o cavaleiro Martinho de Tours, num dia de chuva e frio cortou a sua manta com a espada para dar a outra metade a um mendigo que caminhava quase despido. Segundo a lenda, a chuva terá desaparecido dando lugar aos raios do sol. E, desde então, durante três dias, em pleno Outono, temos o Verão de S. Martinho. 
Um gesto cheio de generosidade que se continua a festejar com alegria, um pouco por todas as terras de Portugal mas também deste Alentejo imenso. 
Aproveite, e junte-se a nós. Venha saborear estas deliciosas iguaria e viva o S. Martinho!!!

Saúde!!!!



Mas cuidado com os copos!

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Olha o Marmelo!

Este fim-de-semana estava ainda um tempo extraordinário para a época. Peguei nas minhas perninhas e fui passear para o campo apanhar ar.  
 

 
No Outono, sabe bem caminhar pelos trilhos, por entre oliveiras e sobreiros.  Gosto de olhar o horizonte até onde a minha vista pode alcançar. Observo as cores da natureza. O verde das árvores e das ervas que nesta altura, depois de um Verão tão longo, estão secas e com uns tons ocres e acastanhados. No ar costuma pairar um perfume a terra seca. Escuto o cantar dos pássaros e sigo os seus voos.
E assim, caminhei sem destino, até que me deparei com um marmeleiro todo carregadinho de marmelos, perdido no meio da vegetação.
Crescera subespontaneamente no campo, como muitos outros frutos que ainda conseguimos encontrar no campo alentejano.  

Fiquei a observar aquela árvore ali sozinha, e foi então que me apercebi que afinal o marmelo não é só aquele fruto ácido e adstringente que nos arrepia quando o comemos cru.











Se olharmos bem para ele, veremos que o marmelo é também um fruto redondo e amarelo como o sol do Alentejo. Um marmelo é forte como é o calor abrasador do Alentejo, mas se cozido lentamente com um pouco de água e açúcar fica mole e suave como o coração do povo alentejano quando lhe sabemos conquistar a confiança. A sua polpa rígida e amarga torna-se deleitosa como a doçura do tempo que por aqui passa.




É isto que o Alentejo tem de bom. Esta sensação de regresso ao passado, a um lugar por onde o tempo não passou. Aqui existe um ambiente e uma atmosfera que não se conhece noutros sítios.
Um destes fins-de-semana, se tiver ocasião, não hesite, venha caminhar por estes campos alentejanos e leve consigo esta sensação de leveza.

A receita de hoje, como não podia deixar de ser:   


MARMELADA
Ingredientes:
1 kg marmelos
1 kg açúcar amarelo
2 dl água

Descascar os marmelos. Cortá-los aos pedaços e pôr a cozer com um pouco de água e o açúcar amarelo.








Depois de cozidos, triturar.












Colocar a massa obtida em taças ou frascos. Para não ganhar bolor, convém cobrir a marmelada com papel vegetal previamente untado com aguardente.
 



Deixar ao sol para secar.

E que tal, comer esta marmelada acompanhada de umas torradinhas? 
Bom proveito!

Sabia que o marmelo é muito rico em água, vitamina C e pectinas. É indicado para combater a tosse e as diarreias, mas também como fortalecedor do aparelho digestivo.  O fruto e o seu sumo podem ainda ser utilizados como elixir oral contra aftas, problemas de gengivas e dores de garganta. Com apenas 39 calorias, é um fruto recomendado a pessoas com restrições alimentares consequentes de problemas de saúde, como excesso de peso ou diabetes. As sementes podem ser usadas em inflamações cutâneas, queimaduras e hemorróidas. (http://idademaior.sapo.pt/sabores-mediterranicos/sabe-bem-faz-bem/marmelo-o-curandeiro/)